terça-feira, 31 de agosto de 2010

ADI – MEU IRMÃO

“... para que nos tornássemos um modelo para ser imitado.”
II Tessalonicenses Cap 2:9.

Naquela estação de trem surgiu em nós a idéia de família – Nova Friburgo. Papai, mamãe, você e eu... Sozinhos para a grande aventura da infância.
A cidade nos acolhia afetuosamente e desenhava uma história de luta e muita felicidade. Quatro e seis anos eram nossas idades cronológicas.
As lembranças dos primeiros tempos são mais fantasias do que realidades. Relatos feitos por papai e mamãe. Ele aumentando o valor dos acontecimentos e, ela com a dramaticidade que lhe era peculiar.
Diante de nossos olhos assustados os novos amigos preenchiam o cotidiano com solidariedade e sobejas manifestações de carinho.
Ruth e Simonini com os filhos miúdos Ana Maria e Paulo Cesar cuja casa nos abrigou até conseguirmos alugar uma casinha pequena montada aos poucos, com doações e objetos comprados com muito sacrifício.
Papai tinha conseguido transferência no emprego público onde exercia uma função administrativa. Foi designado para gerenciar a construção do Fórum de Friburgo pela Secretaria Estadual de Obras RJ. Mamãe logo foi admitida na Legião Brasileira de Assistência.
O rol de amigos aumentava na razão geométrica por conta da facilidade de relacionamento de papai e mamãe.
Laginestra, Bisotto, Zarife só para citar as ilustres famílias locais que nos recebiam como perfeitos anfitriões e mesmo tutores de nossas alienígenas maneiras trazidas da Niterói querida. Agora, era sede do clã familiar em virtude de lá estar a casa do “velho” e da “velha” – os amados avós Pepê e Celina.
Meu irmão, meu Adi querido foi se tornando meu herói, principalmente depois daquela aventura de sairmos numa manhã ensolarada, montado na sua bicicletinha aro 20, carregando corajosamente a irmãzinha no quadro daquela máquina. Como sempre a idéia saía de minha brilhante cabecinha de vento. Nesta manhã quando acordei vi que mamãe e papai não estavam em casa. Logo chamei Adi e chorando o convenci que eles tinham fugido e nos largado. Naquela casa enorme que há pouco tempo havíamos alugado de Seu Elias – Av. Rui Barbosa, 39A. A porta da casa ficava numa escada por ser um sobrado, o que nos obrigava a descer. A fechadura alta demais para as estaturas dos aventureiros quase nos fez abortar o plano. Foi aí que arquitetei o mais fabuloso projeto de pedir a alguém que passasse em frente a casa para abrir a porta para os abandonados. A casa tinha uma varandinha que possibilitou por em prática a nossa intenção de sair para procurar os nossos “pais fugitivos. Convenci um homem que passava comovendo-o com minhas aflições, e ele consentiu em fazer. Jogamos a chave. E, lá fomos nós avenida à fora em direção a praça principal de Friburgo...
Eu chorava sem parar enquanto Adi suava o agasalho para conduzir a sua bicicletinha tinhosa.
Enfim, por esses acasos típicos das cidadezinhas pacatas do interior, fomos avistados por papai e mamãe que vinham com sacolas carregadas com produtos da feira tradicional de verduras e frutas cujas atividades começavam bem cedo para não atrapalhar as ações laboriosas da população.
Apesar de nos render castigos e repreensões também transformou-se em assunto para conversas nas reuniões dos amigos...
Adi meu herói. Crescia cada vez mais o meu sentimento de estar protegida por meu irmão.
E, assim aumentávamos as idades ao mesmo tempo que fortalecíamos os laços de família.
Como se vê, meu irmão por não poder conviver com seus sofrimentos finais, reporto-me ao seu começo e conforto o meu coração que agora precisa aceitar a ausência permanente e definitiva de quem sempre representou um exemplo de força, honestidade, honra, dignidade e determinação.
Transformo a melancolia pela dor de sabê-lo doente, pelo luto de senti-lo perdido pela condenação da condição humana – vida e morte – a traçarem o limite trágico de nossa existência.
É um orgulho para mim compartilhar o mesmo tipo sanguíneo. Somos irmãos!
O seu legado é também a virtude de permanecer Geraldo Trindade de Castro Araújo apesar de todas e abusivas incompreensões. Você é um exemplo a ser imitado por todos os nossos descendentes.
Foi só um recorte de minhas infindáveis lembranças de nossa infância plena de companheirismo e sonhos. Em todas as áreas compartilhamos o mesmo ideal. Vencer os obstáculos pelo trabalho, pela luta, pela ética sempre respeitando e preservando as pessoas e o planeta.
O Sistema que o seduziu, paradoxalmente o exilou porquanto não aceitou o alto preço de comprar-lhe a consciência. E, a decepção pelos efeitos nefastos dos tempos de ganância, com certeza abreviou-lhe os anos de vida.
Por onde passou deixou no rastro as linhas mestras de seu caráter, sua seriedade, seu espírito crítico, sua sabedoria e o alto grau de conhecimento intelectual bem como, seu instinto natural sobre organização e método. Ave Adi – o DNA da dignidade humana.
Sua irmã que te ama
Maria do Carmo Castro Araújo de Queiroz
“imitar um bom exemplo tem mais valor do que aplaudi-lo” - transcrito