quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Adhemar Reis

Maricá, 20 de janeiro de 2010

Há de amar reis. Seu nome seu destino. Autoridade para ele tinha requintes de “palavra de rei”. Sem discussão. Réplica, nem pensar...!
Poderia ter aparência de submissão? Muito pelo contrário. Era respeito. Acreditava em predestinação. Cabeça erguida. Olhos azuis entusiasmados. Sorriso aberto. Assim percorria corredores e gabinetes. Nenhuma barreira impedia o seu acesso. Do hall ao centro do Poder. Todos reconheciam o salvo conduto que marcava sua presença na Prefeitura. A política exercia-lhe fascínio. E Adhemar Reis refletia este sortilégio com arrebatamento. Ou, quando liderava as caminhadas pelas ruas da cidade nas campanhas eleitorais. Ou, nas celebrações da vitória. Conhecia e era conhecido. Pelo povo. Pelos postulantes. Pelos eleitos. Enfim por todos os niteroienses. Dos eventos sociais. Dos encontros políticos. E da vida cultural da cidade.
Figura contraditória. Cultivava um ar enigmático no que se referia à sua vida privada.
De quantas histórias era personagem. Nos mais diversos papéis construídos nos textos comentados nas cercanias do Poder. Nas esquinas e nas praças.
Nada transparecia dessa privacidade resguardada na simplicidade de sua inteligente maneira de escapar das tentativas de penetrarem em sua intimidade.
Só utilizando o olhar do restaurador era possível chegar perto de seus segredos. Por que o olho do restaurador vê além dos objetos gastos ou mesmo degradados e dos estragos praticados por quem não zela por relíquias e despreza preciosas obras de arte.
Esse olhar contra estragos e ações predatórias vem acompanhando há muito tempo, minha passagem na política da Niterói contemporânea. Vejo na transcendência sempre o belo com realce na estética e finalizando na virtude.
Moralismo à parte, virtude é importar-se com o outro, ultrapassando os limites da vilania e da crueldade.
Um dia me presenteou com um ursinho de pelúcia que trago comigo até hoje. Alguém no meio da parafernália e da agitação do poder enxergou o significado de uma colecionadora de brinquedos de pelúcia.
Unimos assim nossa paixão imensa por Niterói e suas idiossincrasias surpreendentes. Porque Niterói é quântica.
Ele se foi de forma brutal e pérfida. Vítima da ausência de misericórdia e cortesia que permeia hoje, assustadoramente a todos nós e o tecido social.
Dois crimes foram praticados: contra sua vida e, no cotidiano de uma cidade que perde com seu ilustre cidadão, o jeito niteroiense de ser feliz por se orgulhar da marca registrada que a define – Niterói cidade Sorriso.
Que hoje chora a perda de mais um de seus pilares de orgulho de a ela pertencer.
De luto nos deixamos arrebatar pela saudade de quem jamais esqueceremos.
Assim homenageio alguém que por esses designos do destino esbarrei no meio de tanto atordoamento.
Sua amiga ausente
Maria do Carmo Castro Araújo de Queiroz

Ps:Deixo-lhe neste texto singelo e despretensioso uma frase sua que tenho certeza que muito o emocionou: “A Praça da Paz Celestial”.
Quem não se lembra da cena antológica de um franzino chinês fazendo parar um tanque de guerra. Sozinho apenas com sua coragem de companheira. E a dignidade de um cidadão.
Escutei pelo menos um ano inteiro Adhemar usar como cumprimento: “Carminha a Praça da Paz Celestial...”. Não era preciso entender. Mas, apenas refletir...